Todos nós temos bem presente a expressão "procuradoria ilícita", mas em que é que se traduz na prática? Importa antes de mais definir o que é um procurador. Um procurador é alguém que age por conta e no interesse de outrem, estando munido de procuração; ora, sempre que uma pessoa singular ou coletiva, pratique em nome de outrem, atos que lhe estão vedados por lei e cuja prática, se encontra atribuída em exclusivo a certas profissões, no caso advogados e solicitadores, incorre na prática de um crime de procuradoria ilícita.
A Lei 49/2004, de 24 de agosto, define quais os atos, ressalvadas certas e determinadas exceções, que só podem ser praticados por advogados e solicitadores; assim, constituem atos próprios de advogados e solicitadores, os seguintes:
- o exercício do mandato forense (nos tribunais judiciais, nos julgados de paz, etc.);
- a prestação de consulta jurídica;
- a elaboração de contratos e a prática de atos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente, os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais (ex.: constituição de sociedade);
- a negociação tendente à cobrança de créditos (ex.: envio de carta ao devedor)
- o exercício do mandato no âmbito da reclamação ou impugnação de atos administrativos e tributários.
Todas estas competências devem ser articuladas com as de outras profissões, por ex., é sabido que o divórcio por mútuo consentimento corre atualmente na conservatória do registo civil, e que os acordos necessários ao decretamento dessa modalidade de divórcio (responsabilidades parentais, casa de morada de família, relação de bens comuns, alimentos ao cônjuge que deles necessitar), podem ser elaborados pelo conservador, pese embora, configurem atos próprios de advogado e solicitador.
Por outro lado, há situações que se encontram claramente à margem da lei, por ex.: os técnicos oficiais de contas são confrontados no exercício da sua profissão pelos seus clientes, com pedidos de elaboração de contratos de trabalho. Trata-se sem dúvida, de um ato da competência de um advogado ou solicitador e cuja prática deve ser recusada por estes profissionais.
Também não é permitido o funcionamento de escritórios ou gabinetes de consulta jurídica, sob qualquer forma jurídica, que não sejam compostos, exclusivamente, por advogados ou solicitadores, ou por advogados e solicitadores e que prestem serviços que compreendam, ainda que ocasionalmente, a prática de atos próprios de advogados e solicitadores.
A divulgação, promoção ou publicitação de atos próprios de advogados e solicitadores, por parte de pessoas singulares ou coletivas não autorizadas à sua prática, constitui contraordenação, sendo sancionada com coima. A reincidência acarreta o agravamento dos limites mínimo e máximo da coima.
A procuradoria ilícita está tipificada na lei como crime semi-público (dependente de queixa), sendo punido com pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias.
Tal como acima deixámos escrito, importa ter em conta as exceções contempladas na lei, e que não constituem crime, como é o caso dos sindicatos e das associações patronais, contanto, que os atos sejam praticados por advogado ou solicitador, e o sejam para defesa dos interesses comuns. Se por ex., estivermos a falar de um divórcio de um trabalhador, já não poderá o sindicato assegurar o patrocínio dessa causa.
O que está em causa é a proteção dos interesses dos cidadãos; há certos atos cuja prática só pode ser assegurada por quem esteja habilitado e munido de conhecimentos especiais.