A seguradora Fidelidade foi obrigada, pelo Supremo Tribunal de Justiça, a pagar o crédito à habitação de um homem que contraiu uma doença oncológica aos 63 anos, apesar de a apólice do seguro estabelecer que perdia o direito a este tipo de indemnização logo aos 60 anos.
Os juízes consideraram que o cliente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) devia ter sido alertado pela seguradora para o fim da cobertura do risco de invalidez.
"Num contexto económico-social em que a maior parte dos portugueses adquire habitação própria com empréstimo bancário e paga, durante uma parte substancial da sua vida, prémios às companhias de seguros para garantia do risco de vida ou invalidez, não pode afirmar-se ser um sacrifício excessivo onerálas com o pagamento das dívidas, sobretudo se não esclareceram devidamente o segurado acerca das cláusulas particulares de exclusão [da apólice]", argumentam.
Doutra forma, acrescentam, citando um acórdão já antigo, a obrigatoriedade de contratar um seguro de vida quando se contrai um crédito à habitação mais não seria do que "um simples artifício destinado a obter mais uma prestação a favor da seguradora, muitas vezes ligada ao grupo de que o banco faz parte".
Era este o caso: quando mudou o empréstimo que tinha no BPI para a Caixa Geral de Depósitos, ainda as contas se faziam em escudos em vez de euros, Domingos Castelar Oliveira, então já com 57 anos, e a mulher assinaram novo seguro de vida pela Fidelidade, do grupo CGD. Da moradia onde residiam em São Lourenço de Selho, uma freguesia do concelho de Guimarães, ainda lhes faltavam pagar 200 mil euros. Não eram gente rica, diz o seu advogado, Clementino Cunha: tinham filhos e trabalhavam ambos numa fábrica de confeções de que eram proprietários.
As más notícias surgem seis anos e uma semana depois, quando é diagnosticado ao empresário, então com 63 anos, um problema do foro oncológico. É considerado portador de uma invalidez total e permanente, com uma taxa de incapacidade permanente geral da ordem dos 72%.
Os juízes consideraram que o cliente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) devia ter sido alertado pela seguradora para o fim da cobertura do risco de invalidez.
"Num contexto económico-social em que a maior parte dos portugueses adquire habitação própria com empréstimo bancário e paga, durante uma parte substancial da sua vida, prémios às companhias de seguros para garantia do risco de vida ou invalidez, não pode afirmar-se ser um sacrifício excessivo onerálas com o pagamento das dívidas, sobretudo se não esclareceram devidamente o segurado acerca das cláusulas particulares de exclusão [da apólice]", argumentam.
Doutra forma, acrescentam, citando um acórdão já antigo, a obrigatoriedade de contratar um seguro de vida quando se contrai um crédito à habitação mais não seria do que "um simples artifício destinado a obter mais uma prestação a favor da seguradora, muitas vezes ligada ao grupo de que o banco faz parte".
Era este o caso: quando mudou o empréstimo que tinha no BPI para a Caixa Geral de Depósitos, ainda as contas se faziam em escudos em vez de euros, Domingos Castelar Oliveira, então já com 57 anos, e a mulher assinaram novo seguro de vida pela Fidelidade, do grupo CGD. Da moradia onde residiam em São Lourenço de Selho, uma freguesia do concelho de Guimarães, ainda lhes faltavam pagar 200 mil euros. Não eram gente rica, diz o seu advogado, Clementino Cunha: tinham filhos e trabalhavam ambos numa fábrica de confeções de que eram proprietários.
As más notícias surgem seis anos e uma semana depois, quando é diagnosticado ao empresário, então com 63 anos, um problema do foro oncológico. É considerado portador de uma invalidez total e permanente, com uma taxa de incapacidade permanente geral da ordem dos 72%.
Quando tenta acionar o seguro, a Fidelidade responde-lhe que nada feito: a apólice que assinou só cobre o risco de invalidez por doença até aos 60 anos. Se não leu as condições do contrato, deveria ter lido.
O caso avança para o tribunal, onde o advogado começa por pôr em causa a lógica de uma apólice que, nas suas condições especiais, só extingue a cobertura de invalidez total e permanente por acidente ou doença aos 65 anos, quando nas condições particulares essa idade é antecipada para os 60 no caso de problemas de saúde.
E estas condições particulares prevalecem sobre as especiais. "Mas este seguro pode ser contratado pelos clientes até aos 65 anos!!!", indigna-se Clementino Cunha. A razão que é dada aos queixosos pelos juízes de primeira instância, perdem-na na segunda instância, quando o Tribunal da Relação de Guimarães acusa o casal de ter agido de má-fé ao recorrer à justiça para obter o pagamento do empréstimo pela seguradora.
Desta vez, os juízes argumentam que Domingos Castelar Oliveira nunca tinha posto o contrato em causa até lhe surgirem problemas de saúde, apesar de nessa altura ter na sua posse, havia seis anos, uma cópia do documento. "A vitimização é o instrumento usado para atingir os seus objetivos", alega por seu turno o advogado da companhia de seguros. "Dizem que a lei protege as vítimas - mesmo quando estas não sejam vítimas de coisa alguma que não a sua ganância e avareza."
O calvário judicial chegou ao fim no mês passado, quando o Supremo decidiu que a Fidelidade vai ter mesmo de pagar à Caixa Geral de Depósitos os 153 mil euros que o casal ainda deve ao banco, mais as prestações que os dois habitantes de Selho (São Lourenço) tiveram de desembolsar desde que a doença se declarou, em agosto de 2007. Porquê? Porque a seguradora não conseguiu provar que cumpriu a sua obrigação de informar devidamente os clientes daquilo que estavam a assinar, nomeadamente das chamadas "cláusulas perigosas para os seus interesses".
"A haver má-fé, seria da seguradora e não do segurado", concluem os magistrados. A Fidelidade devia ter alertado o segurado para o fim da cobertura do risco de invalidez por doença quando este fez 60 anos, "para que o prémio fosse proporcionalmente reduzido, como seria justo e exigível".
O caso avança para o tribunal, onde o advogado começa por pôr em causa a lógica de uma apólice que, nas suas condições especiais, só extingue a cobertura de invalidez total e permanente por acidente ou doença aos 65 anos, quando nas condições particulares essa idade é antecipada para os 60 no caso de problemas de saúde.
E estas condições particulares prevalecem sobre as especiais. "Mas este seguro pode ser contratado pelos clientes até aos 65 anos!!!", indigna-se Clementino Cunha. A razão que é dada aos queixosos pelos juízes de primeira instância, perdem-na na segunda instância, quando o Tribunal da Relação de Guimarães acusa o casal de ter agido de má-fé ao recorrer à justiça para obter o pagamento do empréstimo pela seguradora.
Desta vez, os juízes argumentam que Domingos Castelar Oliveira nunca tinha posto o contrato em causa até lhe surgirem problemas de saúde, apesar de nessa altura ter na sua posse, havia seis anos, uma cópia do documento. "A vitimização é o instrumento usado para atingir os seus objetivos", alega por seu turno o advogado da companhia de seguros. "Dizem que a lei protege as vítimas - mesmo quando estas não sejam vítimas de coisa alguma que não a sua ganância e avareza."
O calvário judicial chegou ao fim no mês passado, quando o Supremo decidiu que a Fidelidade vai ter mesmo de pagar à Caixa Geral de Depósitos os 153 mil euros que o casal ainda deve ao banco, mais as prestações que os dois habitantes de Selho (São Lourenço) tiveram de desembolsar desde que a doença se declarou, em agosto de 2007. Porquê? Porque a seguradora não conseguiu provar que cumpriu a sua obrigação de informar devidamente os clientes daquilo que estavam a assinar, nomeadamente das chamadas "cláusulas perigosas para os seus interesses".
"A haver má-fé, seria da seguradora e não do segurado", concluem os magistrados. A Fidelidade devia ter alertado o segurado para o fim da cobertura do risco de invalidez por doença quando este fez 60 anos, "para que o prémio fosse proporcionalmente reduzido, como seria justo e exigível".
Quando o cliente é o elo mais fraco
A única liberdade é a de ler as muitas cláusulas
A decisão do Supremo Tribunal de Justiça baseiase no entendimento de que em contratos de massas, como é o caso, impostos por grandes organizações aos particulares, é legítimo que estes últimos se demitam do esforço de tentarem entender o conteúdo da papelada que lhes é dada para assinar, um esforço que sabem ser inglório.
"Não se preocupam com o conteúdo destas cláusulas, que conhecem mal ou de todo não conhecem, dada a complexidade das mesmas e a perda de tempo que implica o seu estudo para um leigo, num contexto em que é inútil a sua negociação", escrevem na sentença. "Pois o aderente não tem mais liberdade do que a de assinar ou não o contrato, não gozando qualquer liberdade de fixação do seu conteúdo."
Daí que a lei proteja os particulares enquanto parte mais débil deste tipo de contrato. E que os tribunais "não possam deixar de exercer um efetivo e rigoroso controlo sobre as empresas, dado o enorme poder de que estas dispõem".
Fonte: Página da Ordem dos Advogados